Começamos o ano de 2004 demonstrando, com base_ em dados do “Panorama Laboral”, divulgados pela Organização Internacional do Trabalho (OIT), o fracasso retumbante das políticas neoliberais de desregulamentação das relações sociais para enfrentar o desemprego, evidenciando que as medidas por elas encaminhadas aprofundaram a crise social e econômica no mundo, sendo responsáveis pela tragédia humana e moral de lançamento de um bilhão de pessoas ao desemprego ou à informalidade.
Na Comissão de Assuntos Econômicos (CAE) do Senado Federal, defendemos a tese do privilégio absoluto do crédito trabalhista na nova lei de falências, rechaçando qualquer possibilidade do oferecimento de garantias ainda mais preferenciais que as já asseguradas aos bancos, em detrimento da força de trabalho humana, confrontando, nesse ponto, diretriz lamentavelmente defendida, com ênfase, por todo_ o espectro político. No mundo real, com o apoio das Centrais Sindicais e do Executivo, o valor trabalho foi “coisificado” como sempre. A Anamatra foi a única voz da sociedade civil organizada, desde o início do debate, a postular outros rumos na votação da matéria. E foi por essa razão_ que, ao estourar a crise da Parmalat, sugeriu a adoção do modelo de autogestão, para evitar a dispensa de milhares de trabalhadores. Ao final do novo processo falimentar, infelizmente, prevaleceu a versão governista, apenas preocupada com o mercado.
A revolução provocada pela chamada penhora on line na Justiça do Trabalho atraiu a ira de setores organizados, que utilizaram a mídia para atacar seus avanços, procurando desvirtuá-los, bem como provocaram o Congresso Nacional objetivando proibir os bloqueios eletrônicos e o Supremo para declarar a inconstitucionalidade do convênio firmado pelo TST e Banco Central. A Anamatra esteve do outro lado, combatendo todas essas ações que visavam a perpetuação da ineficácia das decisões judiciais passadas em julgado. A batalha continuará em 2005.
Em conversa informal com jornalistas, o Presidente Lula, bem ao estilo neoliberal dos defensores do insaciável mercado, que também caracterizou seu antecessor, declarou que tudo pode ser objeto de negociação na reforma trabalhista, à exceção das férias de 30( trinta) dias. Depois, ao longo do ano, seguiram-se pronunciamentos, na mesma linha, de flexibilização precarizadora, da Febraban, da Revista Inglesa The Economist, da Fiesp, da CNI, dos analistas do mercado financeiro, de outros membros do Poder Executivo, de pesquisadores das Universidades de Harvard e Yale e também do Banco Mundial. As garras dos defensores do ``deus mercado``, estiveram tão afiadas como as de leões famintos na busca de suas presas indefesas. E como leões, querem a prevalência da velha lei da selva, da exploração sem o marco regulatório do Estado, que, para eles, deve existir apenas para a concessão de benesses aos mais ricos. Não são originais, nem tampouco fiéis aos princípios do velho liberalismo, varrido pela luta da classe trabalhadora.
A Anamatra, fundamentada em deliberações de seus Congressos, não hesitou em repelir todas as intenções malévolas aos Direitos Sociais e Humanos dos trabalhadores brasileiros, pugnando, verdadeiramente, pela ampliação de suas garantias, como medida de justiça e de expansão do mercado consumidor interno. Para tanto, formatou propostas e princípios para as reformas sindical e trabalhista, encaminhando os respectivos documentos ao Tribunal Superior do Trabalho e ao Ministério do Trabalho e Emprego.
Em resumo, durante todo o ano, muitas foram as manifestações da Anamatra contra as iniciativas do Executivo que, a pretexto de incentivarem a geração de empregos, objetivaram flexibilizar a legislação laboral, quando deveriam cuidar, isso sim, de eficazes implementação de medidas fiscais e de concessão de crédito_. Trouxemos da Espanha o catedrático Antonio Baylos, um dos mais renomados juslaboralistas da Europa, tendo ele sentenciado, na Câmara dos Deputados, no TST e nos diversos locais em que proferiu palestras no Brasil, que a precarização arrasa a classe trabalhadora, produz efeito catastrófico na atividade produtiva e diminui o sentido de cidadania.
Ao mesmo tempo, a Anamatra reivindicou a redução da carga horária de trabalho semanal para 40 (quarenta) horas _, considerando que o resultado do avanço tecnológico foi apropriado apenas pelo capital, deixando à margem milhões de pessoas no mundo inteiro. Também defendeu a proibição das horas extras. Mas, para não tratar a questão de maneira isolada, alertou que há necessidade do fomento de políticas voltadas para a geração de empregos, mesmo que para isso o governo tenha que redirecionar prioridades e discutir a forma de pagamento da dívida, interna e externa. Diante da mobilidade física e virtual do capital, assinalou a Anamatra que o offshore deve ser enfrentado com uma nova união internacional dos trabalhadores para se contrapor à globalização egoísta, destruidora da essência do sentido de sociedade.
Numa atitude inédita, com suporte em decisões tomadas em Congressos, a entidade nacional da magistratura trabalhista reconheceu como legítima a greve promovida pelos trabalhadores bancários nos meses de setembro e outubro de 2004, repudiando a tentativa patronal de barrar o movimento com a utilização de mecanismos espúrios para frear o que seria, segundo ela, verdadeiro atentado ao sagrado patrimônio dos banqueiros. Cidadãos e entidades da sociedade civil organizada não podem fechar os olhos para a realidade das selvagens relações de trabalho no Brasil, sobretudo ao que deveria ser direito de qualquer categoria profissional: o de lançar mão desse direito constitucionalmente assegurado para garantir melhor padrão de vida às pessoas trabalhadoras. Greve é um fato social, cujo exercício não pode ser reprimido pelo Estado, e como tal deve ser tratado, jamais como caso de polícia ou circunscrito à esfera policial.
É evidente que setores minoritários da própria magistratura não conseguiram entender, muito menos dimensionar a expressão do apoio da Anamatra à paralisação dos bancários, sob o simplório argumento de que juízes se manifestam apenas nos autos sobre a matéria de sua competência. Ledo engano. A Associação Nacional dos Magistrados da Justiça do Trabalho não é órgão do Poder Judiciário. Congrega juízes, é verdade. Emite opiniões, na qualidade de entidade da sociedade civil organizada. Não recomenda, muito menos interfere nas decisões judiciais dos seus associados. Quando chegou a decretar greve, nos anos de 2000 e 2003, a Anamatra bem que gostaria de receber apoio de outros setores à sua mobilização, -- como gostariam os juízes que a integram. Não temos qualquer dúvida do avanço que representou a iniciativa da entidade, centrada na valorização dos meios de acesso do trabalhador à cidadania, por mais que alguns intensamente se rebelem em relação a essa postura. É extremamente honroso para a Anamatra receber os títulos, lançados como pejorativos, denominando-a de “sindicatão”, de “anamatraca” e de “entidade política”. _ O pré-sócrático Heráclito, precursor da dialética, já dizia _ que é da oposição de idéias que nasce a unidade do mundo, pois “todas as coisas opõem-se umas às outras, e dessa tensão resulta a unidade do mundo”. Portanto, é absolutamente natural a reação ao novo. Alenta-nos, porém, o amplo apoio dos cidadãos associados da Anamatra, que também tiram as togas quando deixam as salas de audiência e os seus gabinetes.
A luta contra o trabalho escravo não teve trégua por parte da Anamatra. Logo no início do ano, pistoleiros de aluguel contratados por fazendeiros da cidade de Unaí-Go assassinaram três fiscais do trabalho e um motorista do Ministério do Trabalho. Emitimos nota oficial de pesar e de protesto, solicitando aos Ministérios da Justiça e do Trabalho investigação e punição dos autores da chacina. Na Câmara dos Deputados, na companhia de outras entidades, com destaque para a OIT, a Anamatra perseguiu a aprovação da PEC que permite a expropriação das terras dos escravocratas. Apesar das cobranças feitas ao Poder Executivo, nada foi suficiente para permitir a conclusão dos trabalhos legislativos. Debatemos em comissões do Congresso Nacional, em Brasília, no Rio de Janeiro, no Pará, no Mato Grosso, na Câmara dos Vereadores de São Paulo e em diversas outras unidades da Federação, a chaga do trabalho escravo no Brasil. A pregação nos valeu outro título honroso, conferido pela ultra-reacionária Tradição, Família e Propriedade (TFP), que, por meio de livro distribuído a parlamentares, enquadra a Anamatra como a mais severa anti-capitalista do mundo moderno. Essa é uma batalha que será enfrentada enquanto existir um ser humano laborando em condição análoga à de escravo. Quando o Vice-Presidente da República, José Alencar, tentou minimizar o problema, revelamos o equívoco de Sua Excelência, a partir do descortinamento do drama reconhecido pelo próprio governo que ele integra.
No início de maio de 2004, na cidade de Campos do Jordão, realizamos o nosso 12º Congresso (Conamat), com a presença recorde de 836 (oitocentos e trinta e seis) juízes do trabalho, cuja tônica foi a defesa dos Direitos Humanos Trabalhistas, enfrentando o dilema da afirmação e resistência dos direitos sociais para realçar a centralidade do trabalho humano no contexto de uma economia que a cada dia mais se entrega ao capital. Ao final, na Carta de Campos do Jordão, a Plenária condenou a política beligerante de George W. Bush e de seus seguidores, reafirmando a necessidade do respeito ao princípio da autodeterminação dos povos, à dignidade humana, ao pluralismo, à tolerância e à ordem jurídica internacional. Repudiou, ainda, a tentativa de diminuição do patamar de garantia dos direitos sociais e pugnou pela ampliação da competência da Justiça do Trabalho
No mesmo local, antes da abertura do Conamat, o Conselho de Representantes da Anamatra esteve reunido e decidiu, com o voto de 17 (dezessete) das 24 (vinte e quatro) Amatras, pelo desligamento institucional da AMB – Associação dos Magistrados Brasileiros. Foi uma decisão difícil, com alguns traumas, mas até mesmo tardia. Os juízes do trabalho têm uma entidade de âmbito nacional, que há muito tempo busca cumprir agenda que transcende o perfil corporativo. O eixo de qualquer movimento coletivo deve primar pela busca da unidade no interior da respectiva categoria ou do segmento representativo da sociedade. A unidade real, todavia, não é a mera reunião de pessoas numa sigla orgânica, sem o cumprimento do conteúdo finalístico para o qual estão entrelaçadas. Ela pode acontecer, de forma mais legítima, quando são reconhecidas as diferenças e construídas as alianças em torno de princípios comuns, dando sentido ao conceito de união. O receio de enfrentar a realidade, muitas vezes, apresenta-se como obstáculo ao desenvolvimento mais harmônico das entidades de classe da magistratura brasileira. Deixar a AMB significou o reconhecimento do óbvi na prática, já estávamos desvinculados. Também do fato de que não necessitamos de duas entidades de âmbito nacional para cuidar das mesmas questões. Vencemos uma etapa importante na nova quadra do movimento associativo da magistratura nacional.
Na semana seguinte ao Conamat, dois fatos marcaram a agenda da Anamatra.
No sítio da internet da OAB havia notícia de “que o presidente da OAB havia recebido denúncia de conselheiro dando conta da existência de campanha da Anamatra pela extinção do quinto constitucional”. O Presidente Busato repudiava a atitude da Anamatra, que não tinha o direito de assim agir sem consultar a OAB, como também solicitava _ discussão sobre o assunto. Estranhamos o modo peculiar e pouco democrático do enfrentamento da posição externada pela Anamatra, esclarecendo que a entidade dos juízes do trabalho não necessita da autorização de qualquer pessoa, além dos órgãos próprios de deliberação, para firmar os seus pontos de vista. Repudiamos publicamente o comportamento da OAB, requerendo ao seu Presidente que designasse o debate para o local desejado. Educado e gentil, o Presidente da nobre entidade, dias depois, na posse da nova direção da Ajufe, esclareceu que não fora esse o objetivo, solicitando que fossem relevados eventuais incidentes causados pela manifestação. Continuamos, assim, com a relação fraterna e franca com a OAB, que tanto fez pelo restabelecimento democrático no país, inclusive apoiando a campanha ora empreendida pela entidade em defesa da República e da Democracia, sugerida pelo jurista Fábio Konder Comparato.
Outro fato que mereceu repúdio da Anamatra foi a expulsão autoritária do jornalista norte-americano Larry Rother, responsável pela produção de matéria preconceituosa contra o Presidente da República. A reação da Anamatra foi contundente em defesa da liberdade de manifestação, da imprensa livre e dos primados constitucionais, tendo sido a primeira entidade a encaminhar mensagem ao Presidente da República solicitando o cancelamento do ato do Ministério da Justiça. Meses depois, novamente, enviou ofício ao Palácio do Planalto sugerindo a retirada do projeto de lei que pretendia criar um conselho para fiscalizar as atividades desempenhadas pelos jornalistas.
Foram muitas as ações da Anamatra no ano de 2004 _ voltadas para o aprimoramento de magistrados. Na área cultural merecem destaque a celebração de convênio com a Universidade Castilla La Mancha da Espanha para realização do curso de doutorado por 25 juízes , além de intenção já revelada ao Cesit da Unicamp de estabelecimento de parceria. Na área de prerrogativas, cabe enfatizar a reivindicação do restabelecimento de garantias suprimidas pelas reformas previdenciárias, mediante ajuizamento de 4 (quatro) ADIs.
Em sede político-institucional cumpre destacar o repúdio, manifestado em nota oficial, aos diagnósticos tendenciosos relativos ao Poder Judiciário produzidos e divulgados pelo Ministério da Justiça. Também a repulsa a declarações do Presidente do PT de “enquadramento” do Judiciário, a defesa do poder de investigação do Ministério Público, bem como a criação do Fórum de acesso a informações públicas (a Anamatra é uma das fundadoras), além de várias outras iniciativas tendentes a aprofundar o debate em torno da efetividade do conceito de Estado Democrático de Direito.
Marcou profundamente a história da entidade a homenagem prestada pela Câmara dos Deputados à Anamatra, em sessão solene realizada no Plenário daquela Casa Legislativa, na_ manhã do dia 04 de novembro de 2004, repleto de juízes e de outros convidados. Todos os líderes partidários, mesmo os que divergem das posturas políticas defendidas pela entidade, reconheceram a importância da associação nacional no cenário político do Congresso Nacional, oferecendo críticas, sugestões e propostas aos parlamentares, para os mais diversos temas ali debatidos.
Com o término do processo constitucional de reforma do Poder Judiciário, é evidente que a população aguarda uma nova dinâmica no funcionamento do aparelho estatal incumbido de distribuir justiça, desde o fim da morosidade à transparência dos atos praticados por magistrados, no exercício dos ofícios judicantes e administrativos. O processo revisional parlamentar não foi capaz de enfrentar alguns dogmas que conduziriam o Judiciário a adquirir legitimidade real. Ainda que conservadora seja a reforma, os juízes devem adotar urgentes medidas, judiciais, políticas e administrativas, _para atender os legítimos anseios da imensa maioria do povo brasileiro.
E foi observando tais parâmetros que buscamos a instituição de um Conselho Nacional de Justiça com a participação da sociedade civil organizada, como órgão de planejamento estratégico, político, administrativo e orçamentário do Poder Judiciário, com funções disciplinares originárias para os tribunais superiores e em grau de recurso para as demais instâncias. Se fosse democraticamente composto, deveria cuidar das relações funcionais hoje atribuídas às cúpulas, em grande parte responsáveis pela ausência de independência interna de alguns magistrados. O CNJ oriundo da EC N° 45/04 possui outro modelo, dando atenção apenas às funções disciplinares, sendo formado sem a indispensável aferição de legitimidade, eis que os seus membros serão escolhidos sem qualquer consulta, seja no âmbito da magistratura, seja quanto à sociedade civil organizada. O Conselho merece crítica, não pelo fato de ter a participação de cidadãos, mas porque o filtro da indicação de seus integrantes e as suas restritas competências comprovarão que a decantada ousadia foi limitada, incapaz de conseguiu enfrentar os grandes desafios da implantação de um verdadeiro autogoverno do Poder Judicário, cuja_ independência jurisdicional deve ser a meta primeira perseguida.
A instituição da súmula vinculante não apenas atenta contra essa independência do juiz, como também é nociva aos interesses dos setores da sociedade civil que não possuem voz ativa nos poderes constituídos. Trabalhadores, consumidores e minorias perdem com a concentração de poder nas cúpulas do Judiciário, problema agravado a partir do momento em que a opção bonapartista do Presidente da República na escolha dos ministros do Supremo manteve-se intacta na recente reforma.
Atacando o núcleo da reforma levada a efeito, a Anamatra e as Amatras, durante anos, elegeram como prioridade pontual a ampliação da competência da Justiça do Trabalho, para dar maior racionalidade ao sistema, numa época de profundas transformações do mundo do trabalho. Ainda que a reforma não tenha atribuído todo o regime de competência perseguido pelos juízes do trabalho, são notórios os avanços conquistados. A divisão competencial entre os diversos segmentos da Justiça para julgar as lides oriundas do trabalho, além da notória irracionalidade, consagra a fragmentação obreira verificada na nova ordem econômica, reduzindo milhões de pessoas ao patamar dos que não têm acesso ao Judiciário que julga as causas dos trabalhadores.
Pois bem. A EC 45/04 estabelece que compete à Justiça do Trabalho julgar todas “as ações oriundas da relação de trabalho”, sejam os litígios entre empregados e empregadores ou entre quaisquer trabalhadores e os tomadores de serviço. Os trabalhadores autônomos, bem como os respectivos tomadores de serviço, também terão as suas controvérsias julgadas pela Justiça do Trabalho. Corretores, representantes comerciais, médicos, publicitários, engenheiros, arquitetos, mestres de obras, estagiários, consultores, contadores, economistas, além de tantos outros profissionais liberais, ainda que não empregados, assim como as pessoas que locaram a mão-de-obra (contratantes), quando do descumprimento do contrato firmado para a prestação de serviços, poderão procurar a Justiça do Trabalho para solucionar os conflitos que tenham origem em tal ajuste, escrito ou verbal. Discussões em torno dos valores combinados e pagos, da execução dos serviços e a sua perfeição, além dos direitos de tais trabalhadores, estarão presentes nas atividades do magistrado do trabalho.
Os juízes do trabalho estão aptos para julgar as demandas que tratam dos conflitos de todas as relações de trabalho, assim como _os litígios entre sindicatos, os mandados de segurança, o habeas corpus e o habeas data, as ações de indenização por dano moral ou patrimonial e as ações que envolvam o exercício do direito de greve. Além da especialidade na matéria, dos contornos que serão atribuídos aos contratos de trabalho de natureza civil, numa época em que o recente Código Civil rompeu com a filosofia liberal clássica individualista para incorporar noções do Direito Social do Trabalho como valores indisponíveis, nada melhor do que a atuação do magistrado social em tal esfera, que deve estar acompanhada de princípios informadores da celeridade, da prestação jurisdicional justa e da efetividade de suas decisões. Pelo menos um passo à frente foi dado na Reforma do Poder Judiciário recentemente concluída.
No plano institucional interno, várias foram as frentes que mereceram atuação da Anamatra no ano de 2004. Atos da então Presidente do TRT da 11ª Região foram atacados no TST, no STJ e no TCU, com a cassação de medida que afastou juíza das suas funções sem o devido processo legal e o acatamento, pelo procurador geral do TCU, de representação da Anamatra que denunciou gastos em excesso com diárias e passagens. Merece destaque a posição firme contra a resolução do TRT da 23ª Região que atentava contra as prerrogativas da magistratura de primeira instância daquele regional. Repudiamos todas as tentativas de verticalização do Judiciário, ora defendendo o atingido por decisão do TST, ora solidarizando-nos com os colegas da primeira instância vítimas da prepotência de corregedores regionais. Aliás, noutros casos, representações da Anamatra ao Ministério Público Federal, apresentadas no ano 2004, propiciaram o processamento de ações criminais públicas contra ex-dirigentes de regionais perante o STJ
Teve prosseguimento a luta contra o nepotismo na Justiça do Trabalho. Denunciamos ao TCU casos de nepotismo no TRT da 22ª Região e solicitamos aos regionais da 3ª e da 15ª que exonerassem os parentes de magistrados irregularmente admitidos, conforme decisões da Corte de Contas. A 15ª exonerou, por motivos diversos,_ a maioria dos servidores em tal situação, enquanto a 3ª preferiu recorrer. Com a decisão do Conselho sobre o reconhecimento de um caso de nepotismo na 12ª Região, logo depois do ofício encaminhado pela Anamatra ao Tribunal, a servidora pediu exoneração. Na 2ª Região, quando a matéria foi pautada para análise pelo Conselho da Anamatra, houve a exoneração do servidor.
Fechamos o ano de 2004 com o lançamento, no dia da Justiça, do Programa “Trabalho, Justiça e Cidadania”, no Senado Federal, apresentando ao público a “Cartilha do Trabalhador” em quadrinhos.
Num País como o nosso, em que mais de 40 milhões de pessoas trabalham sem carteira assinada ou simplesmente integram as dramáticas estatísticas da exclusão social, sequer é preciso investigação científica para atestar o quadro grave das relações de trabalho_. O direito do trabalho, protegido pelas regras previstas na CLT e na Constituição Federal, é uma garantia de respeito à dignidade humana. Mas só a existência de leis que asseguram direitos não é suficiente. É preciso conhecê-los para poder exigir o cumprimento dessas conquistas alcançadas depois de sangue, suor e lágrimas da classe trabalhadora.
A entidade dos juízes do trabalho tem marcado a sua atuação pela resistência à precarização do direito do trabalho, rechaçando o discurso das elites, nacionais e estrangeiras, no sentido de que a legislação protetora atrapalha o desenvolvimento da economia nacional, levando à ruína empresas e empregadores. Mas a Anamatra não assiste a tudo como se fosse obra do destino ou na condição de entidade bem comportada frente às injustiças sociais. O seu papel é de atuação crítica e de luta pela ampliação de direitos aos trabalhadores, exigindo, ainda, o cumprimento das garantias hoje asseguradas.
É dentro de tal cenário, pois, que foi lançada a cartilha em quadrinhos, numa linguagem simples e atrativa, como instrumento de informação e conscientização sobre os direitos básicos dos trabalhadores.
É tarefa da Anamatra buscar a implementação do preceito constitucional que define o trabalho como valor fundamental da República Federativa do Brasil, fazendo respeitar os direitos sociais existentes e lutando para ampliá-los como medida de justa distribuição de renda no país. Busca-se, com este material, promover maior integração do Poder Judiciário com a comunidade, auxiliando no desenvolvimento da cidadania, estimulando o respeito aos direitos humanos dos trabalhadores e defendendo o mais amplo acesso à justiça.
Com o Programa “Trabalho, Justiça e Cidadania”, a atual diretoria da Anamatra cumpre um dos mais importantes compromissos assumidos com os associados e com a sociedade brasileira, sempre com o apoio das Amatras. Estaremos nas escolas, nos sindicatos e nas comunidades organizadas distribuindo noções de cidadania, tendo como a perspectiva que nos move _ sempre a da ética, como princípio do conhecimento, a da justiça social e a de um mundo mais justo e fraterno para os milhões de excluídos.
Uma outra medida importante diz respeito ao encaminhamento do projeto de lei, pelo Supremo, no dia 14 de dezembro de 2004, que fixa os subsídios da magistratura da União, ação que permitirá o estabelecimento do teto moralizador na Administração Pública, como reivindicado pelos juízes do trabalho e por sua entidade de classe nacional.
Tudo o que foi realizado no ano de 2004 pela Anamatra é fruto do esforço dos diretores da entidade, do trabalho incansável das Amatras e de inúmeros colaboradores. As medidas adotadas sempre tiveram o indispensável respaldo da imensa maioria dos associados, revelado nas mais diversas manifestações que pudemos perceber nas andanças país afora, no contato direto com os associados e na ágil lista de discussão da internet, veículo de interação que o dirigente associativo deve valorizar.
2005 nos espera com muito vigor e desassombro para o enfrentamento das adversidades, características próprias da jovem e madura Anamatra, evidenciadas ao longo dos seus 28 (vinte e oito) de existência, que sempre preferiu o embate à complacência com os desmandos, os direitos dos trabalhadores à subtração promovida pelas elites, os direitos humanos à violência praticada pelo Estado e os interesses da sociedade à defesa de falsas prerrogativas.