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Nova competência da Justiça do Trabalho: desmontando conceitos

"Haverá uma evolução ou uma involução? O tempo dirá. Uma coisa é certa: haverá uma transformação profunda da Justiça do Trabalho"
Sebastião Tavares Pereira é juiz do trabalho aposentado, professor de Direito Processual Trabalhista na ACE/Joinville e advogado

Correndo pelas varas do Estado, como juiz do trabalho substituto, havia um momento indispensável na primeira chegada. “Aqui, onde sentam os empregados?”, eu perguntava.   “Empregados  à esquerda e patrões à direita”, alguém respondia. Advogados chegados à cidade ainda enfrentam a mesma dúvida.

A pergunta, apesar da singeleza e da imprecisão, escondia muitas pré-concepções. Elas até   agora se encaixavam no arcabouço teórico-ideológico da área  e não chamavam a atenção. Mas  ganharão crescente importância a partir da nova competência fixada para a Justiça do Trabalho.

Examinemos uma delas,  que começa a ser desmontada. Trata-se da associação de “empregado” com  autor e de “empregador” com  réu.  

Nas salas de audiência, as partes punham-se, em 99,9% dos casos, da mesma maneira: empregado sempre de um lado da mesa(esquerdo, por exemplo) e empregador do outro(direito).   E daí?  Daí que em 99,9% das ações ajuizadas o empregado demandava contra o patrão. A mesa expunha a luta do empregado contra o empregador, para receber seus direitos. 

E tudo ganhava um objetivo preciso, em consonância com a luta Davi / Golias que ali se expunha,  desde a lei material, passando pela processual, até às portarias, provimentos, regimentos.  A visão incrustada nas normas espraiava-se para o agir dos magistrados, como não poderia deixar de ser, e  inspirava um proceder naturalmente sintonizado com a característica histórica da área empregatícia. Marx falaria da luta de classes.

Até 30.12.2004,  a luta do empregado contra os desmandos do empregador orientava tudo, na Justiça do Trabalho. Basta ver, por exemplo,  as recentes ações institucionais do  Tribunal Superior do Trabalho contra o trabalho escravo e as das associações de magistrados trabalhistas contra a  nova Lei de Falências, pelo esvaziamento de direitos dos empregados.  
Toda a principiologia básica aplicada na área, portanto,  se desnudava naquela  polaridade sistemática das salas de audiência.  Por imposição legal,  uma aura de proteção cobria um dos lados da mesa – o do empregado – o que significava dizer que a outra dispunha da técnica a seu favor. Nada mais. Isso chegava à cabeça dos magistrados.  Daí nascia uma lógica própria, norteadora do processo e da decisão, só longinquamente formal-silogística, mas muito aberta às investidas dos valores informativos da lei e da ideologia dominante na área. Valores consagrados naquela aura protetiva referida.

Pois bem. A primeira ação trabalhista ajuizada em Florianópolis, em 2005 – li hoje no informativo do Tribunal Regional do Trabalho de SC – traz para a sala de audiências uma empregadora, que vai ocupar o antigo lugar reservado aos empregados, e o Estado, que vai sentar no lugar antes ocupado pelos empregadores.  A empregadora move ação contra a União.
Deixemos de lado tudo que isso significa em prejuízo da especialização da JT – por atrair leis diversas a serem aplicadas etc -,   da celeridade – pois o Estado vai recorrer até o STF e um canal restrito do empregado passa a ser ocupado por interesses que lhe são estranhos -,  das questões processuais – como a da sucumbência, da gratuidade, da oralidade, do procedimento -,  e foquemos apenas o aspecto em exame.

No dia da audiência desse processo, o magistrado não verá, mais, pairando sobre o lado da mesa em que sentava o empregado, aquela nuvem de princípios de proteção que davam ao conjunto sua peculiar e constante aparência.  Ela não estará lá. A atuação de anos a fio,  acompanhada e orientada por aquela névoa inspiradora,  terá de ser repentinamente substituída por um agir diferente, sem um suporte valorativo amadurecido e sólido.

O magistrado não terá diante de si  um daqueles momentos típicos da luta do hipossuficiente contra o bem sucedido. Estará no ar uma luta nova, do  bem sucedido contra o maior dos vilões – o Estado.  Os últimos 350 anos da cultura ocidental, desde Locke até as atuais lutas pela derrocada dos regimes totalitários sobreviventes e pela afirmação dos direitos humanos, representaram a busca de meios de domínio e contenção do  Leviatã – o Estado – e de defesa do privado, no qual se insere o  empregador autor.  Se, para além da técnica processual, entender-se que uma parte deve merecer algum “benefício”, na mesa, parece que será o empregador.

Simples, não é?  Não.  Há um desmonte a ser feito. Seja para se pôr tecnicamente diante das partes, seja para assumir uma postura voltada a promover um  equilíbrio na relação, desde que se entenda devida, é necessário desvencilhar-se de uma herança.  No primeiro caso, menos dolorosa. Tratamento igual e técnico.  No segundo, entendendo-se cabível tratamento processual tendente à promoção do equilíbrio entre o privado – o fraco – e o Estado,  mais doloroso.  Dever-se-á destruir aquela visão corriqueira, de vilão da relação, que o empregador carrega, e substituí-la por outra, incompatível, de vítima da relação.  

Na audiência  do processo seguinte, da pauta, ainda segundo o antigo figurino – empregado x empregador – o magistrado se voltará a orientar pela tábua de valores das últimas décadas.  Em pouco tempo, tais alternâncias se sucederão no dia a dia. A visão especializada, focada na relação empregatícia e suportada em valores muito bem fixados, se diluirá. Interesses juridicamente protegidos, de outra natureza, demandarão a atenção e o esforço do juiz do trabalho.

Haverá uma evolução ou uma involução? O tempo dirá. Uma coisa é certa: haverá uma transformação profunda da Justiça do Trabalho.

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